CPT e organizações sociais do estado do Pará denunciam ação da Polícia Civil no complexo Divino Pai Eterno, na Gleba Misteriosa, São Félix do Xingu (PA). Em Nota Pública, elas relatam em Nota Pública “Entre os dias 19 e 21 de janeiro, uma mega operação envolvendo policiais civis das Delegacias de Conflitos Agrários – DECA de Altamira, Redenção, Marabá e polícia científica, deixou revoltadas as 152 famílias que há 14 anos ocupam o complexo Divino Pai Eterno, gleba Misteriosa… Chama especial atenção o fato de a denúncia ter sido realizada pelo grileiro Edson Coelho junto à DECA de Altamira, se o município de São Félix do Xingu está sob jurisdição da DECA de Redenção, responsável pelas investigações de todas as denúncias realizadas com relação a este conflito. Ressalte-se ainda, que o delegado Ivan Pinto é alvo de investigação perante a Corregedoria da Polícia Civil e o Ministério Público do Estado do Pará, a partir de denúncia feita por entidades de direitos humanos com pedido de afastamento de suas funções, por abuso de autoridade e violações de direitos humanos em decorrência de ações praticadas enquanto estava à frente da DECA de Marabá. O Delegado possui como prática de atuação favorecer fazendeiros grileiros de terras públicas e proceder de forma ilegal contra pequenos agricultores”.
Ação da Polícia Civil gera danos e revolta entre famílias do complexo Divino Pai Eterno,
em São Félix do Xingu (PA)
Mais uma operação arbitrária é chefiada pelo Delegado de Polícia Civil Ivan Pinto, com objetivo de favorecer grileiros e intimidar trabalhadores/as rurais, dessa vez no município de São Félix do Xingu, Pará, palco da recente chacina contra uma família de ambientalistas da região. Entre os dias 19 e 21 de janeiro, uma mega operação envolvendo policiais civis das Delegacias de Conflitos Agrários – DECA de Altamira, Redenção, Marabá e polícia científica, deixou revoltadas as 152 famílias que há 14 anos ocupam o complexo Divino Pai Eterno, gleba Misteriosa.
A operação possui como justificativa o cumprimento de um mandado de Busca e Apreensão assinado pelo juiz da comarca de São Félix, para apurar suposta prática de crime ambiental, com ordem para “coletar elementos de provas relacionadas à presente investigação, na área da fazenda Flor da Mata III”. O juiz acrescentou ainda que o objetivo da ordem era: “descobrir objetos necessários à prova de infração e defesa do réu”, além de elementos de convicção. O pedido foi feito pelo delegado Ivan Pinto a partir de denúncia do fazendeiro Edson Coelho dos Santos, conhecido como “Cupim”, alegando que as famílias ocupantes da área de mata da propriedade, estariam cometendo crime ambiental, esbulho possessório e porte de armas. O que gerou revolta das famílias foi a forma como o delegado requereu e conduziu a busca e apreensão.
No dia 05/01/2022, o mesmo juiz atendeu a um pedido de medida cautelar requerida pelo delegado titular da DECA de Redenção contra o fazendeiro Edson Coelho dos Santos, o Cupim, a partir de denúncia feita pelas famílias em razão das ameaças recebidas por parte de pistoleiros ligados a Cupim e outros fazendeiros, que tentam expulsar violentamente as famílias do Complexo Divino Pai Eterno. A decisão do juiz contra os grileiros foi proferida nos seguintes termos: “Proibição de acesso ao Complexo Divino Pai Eterno, localizado na zona rural do município de São Félix do Xingu, precisamente, onde estão acampados os integrantes do movimento sem-terra; proibição de que os representados se dirijam ou enviem mensagens através do aplicativo WhatsApp, ou qualquer outro meio, seja ele virtual ou físico; proibição de manter contato ou dirigir-se a qualquer integrante do Complexo Divino Pai Eterno, seja presencialmente, seja virtualmente ou por interpostas pessoas”.
A medida judicial contra os grileiros Edson Coelho dos Santos, o “Cupim”, Bruno Peres de Lima e Arnaldo Pereira Viana tem como objetivo fazer cessar as ameaças e intimidações sofridas pelos trabalhadores/as rurais da área. No entanto, contrariando o que determina a ordem, nos dois dias em que o delegado esteve na área montou sua base na sede da fazenda de Edson Coelho dos Santos, o Cupim, e circulou na área ocupada pelas famílias, acompanhado pelo fazendeiro. Além de desrespeitar a decisão judicial o Delegado ainda insistiu em apreender os animais das famílias encontradas na área. No entender dos trabalhadores/as rurais, apreensão de gado não estava descrito no mandado. As famílias denunciaram ainda, que além do excesso usado na invasão das residências, houve também reuniões diurnas e noturnas coordenadas pelo delegado, com forte intimidação aos colonos e com afirmações falsas sobre a situação fundiária da área.
Chama especial atenção o fato de a denúncia ter sido realizada pelo grileiro Edson Coelho junto à DECA de Altamira, se o município de São Félix do Xingu está sob jurisdição da DECA de Redenção, responsável pelas investigações de todas as denúncias realizadas com relação a este conflito. Ressalte-se ainda, que o delegado Ivan Pinto é alvo de investigação perante a Corregedoria da Polícia Civil e o Ministério Público do Estado do Pará, a partir de denúncia feita por entidades de direitos humanos com pedido de afastamento de suas funções, por abuso de autoridade e violações de direitos humanos em decorrência de ações praticadas enquanto estava à frente da DECA de Marabá. O Delegado possui como prática de atuação favorecer fazendeiros grileiros de terras públicas e proceder de forma ilegal contra pequenos agricultores.
Importante lembrar que no complexo Divino Pai Eterno, seis trabalhadores foram assassinados em razão do conflito. As duas últimas vítimas foram as lideranças Osvaldo Rodrigues Costa, morto em 16/11/2015 durante ação de pistoleiros que se apresentaram como policiais e declararam agir a mando dos grileiros; e Ronair José de Lima, assassinado em uma emboscada dentro da área em14/08/2016. Ninguém foi julgado e punido pelos crimes.
Além disso, o complexo Divino Pai Eterno foi objeto dos crimes de grilagem, desmatamento e extração ilegal de madeira, praticados pelos grileiros citados. No entanto, não temos informações de que nenhum deles tenha sido investigado pela Polícia Civil. A Fazenda Flor da Mata III, cuja titularidade é reivindicada por Edson Coelho possui um histórico de ilegalidades, dentre eles falsificação de documentos alusivos a supostos direitos de posse. Uma investigação realizada pelo Greenpeace aponta que essa mesma área, registrada em nome do grileiro, comercializou gado “diretamente com a JBS de Marabá, e indiretamente, por meio da Fazenda Nova Conquista, também pertencente a Edson”, mesmo com as denúncias de grilagem e conflitos. A mesma pesquisa destaca que Edson Coelho foi preso acusado de participação em ameaças, agressões e mortes de agricultores. Bruno Peres também foi alvo de mandado de prisão, não cumprido pela Polícia Civil, acusado pelo assassinato de Osvaldo, em 2015.
A disputa pela posse do complexo Divino Pai Eterno se desenrola desde 2008. A área é constituída de 9.700 hectares terras públicas federais e foi objeto de grilagem pelos fazendeiros citados, que buscaram a regularização fundiária junto ao Programa Terra Legal a partir de processo fraudulento, com falsificação de documentos, fracionamento da área e uso de laranjas. A Justiça Federal de Redenção já decidiu pela imissão do INCRA na posse da área, para que seja efetivado o assentamento das famílias sem-terra. No entanto, desde que Bolsonaro assumiu o governo proibiu o INCRA de criar novos assentamentos; dessa forma, as famílias voltam a estar sujeitas a ações violentas por parte dos fazendeiros que tentam retomar a área pelo uso da violência.
Não é demais lembrar que neste mês de janeiro, São Félix do Xingu foi palco da chacina que vitimou uma família de ambientalistas residentes na zona rural do município em circunstâncias ainda não esclarecidas pela Polícia Civil do Estado do Pará. Em nota recentemente publicada acerca deste episódio de violência, os dados registrados pela CPT apontam que nas últimas quatro décadas, 62 trabalhadores rurais e lideranças foram assassinados em São Félix do Xingu, em decorrência de conflitos pela posse da terra, e em nenhum dos casos houve julgamento de algum responsável; desde o massacre de Pau D’arco em 2017, 12 lideranças rurais foram mortas nas regiões sul e sudeste do Pará e somente em 2 casos foram elucidados.
As entidades que assinam essa nota, não estão questionando a decisão do juiz e nem se opondo à apuração da denúncia de crime ambiental na área, o que questionam é a parcialidade e o abuso de autoridade dos que comandam a operação da Polícia Civil, ao praticar ações que podem agravar ainda mais o conflito que já se arrasta há 14 anos. Frente a situação aqui relatada, solicitamos que medidas sejam tomadas no sentido de: apurar os excessos praticados pela equipe da Polícia Civil que participou da operação chefiada pelo delegado Ivan Pinto; exigir do INCRA a retomada dos procedimentos para cumprimento da ordem judicial de imissão de posse e efetivação do assentamento das famílias na área do complexo Divino Pai Eterno.
Tucumã/ Belém (PA), 01 de fevereiro de 2022.
Comissão Pastoral da Terra – CPT Regional Pará
Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos SDDH
Organizações e entidades que apoiam a nota.
IZM – Instituto Zé Claudio e Maria
Paróquia São Félix – São Félix do Xingu
Pastoral Social dos Missionários Xaverianos do Alto Xingu
UNIFESSPA – Instituto de Ensino do Xingu
SINDICATO DOS DOCENTES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO SUL E SUDESTE DO PARÁ (SINDUNIFESSPA)
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